MESAS DE DISCUSSÃO
AUDITÓRIS 1, 2 E 3 DA FACE/UFMG
Av. Antônio Carlos, 6.627, Pampulha
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Dia 13 de abril – quarta-feira
A imagem como representação e performance
Para alem de sua dimensão representacional, a imagem parece hoje ter ressaltada sua dimensão performativa: em seu apelo realista, ela se aproxima e, mais do que isso, convoca a vida ordinária, tornando-se um espaço intensamente produtivo. A mudança se percebe no âmbito dos shows de realidade televisivos, nos quais a vida real é demandada a participar, a se expor, a interagir e a colaborar. Essa lógica atravessa outros domínios de produção de imagens e, à sua maneira, o cinema se defronta com ela: vários filmes contemporâneos incorporam, em sua mise-en-scène e em sua escritura, as estratégias do jogo e da performance. Resta-nos pensar, filme a filme, que implicações estéticas e políticas se produzem a partir destas estratégias.
// 14h30 às 15h30 – André Brasil (UFMG)
O dano da performance: alguns exercícios de análise
Vários filmes brasileiros recentes entre eles, Serras da Desordem (2006), Moscou (2009), Avenida Brasília Formosa (2010), O Céu sobre os Ombros (2010) e Os Monstros (2010) se criam na passagem entre as formas de vida e as formas da imagem. Nestas obras, a vida ordinária produz ficção – produz imagens – e, em via inversa, se produz nas imagens, é produzida na e pela ficção. O operador fundamental desta passagem é, a nosso ver, a performance das personagens no filme. Se, por um lado, vinda do mundo vivido, ela faz “arriscar a ficção”, por outro, produzida como imagem, ela faz “arriscar o real”. Por meio de uma concepção dissensual de performance, trata-se assim de recusar tanto a submissão do vivido ao imaginado quanto, em via inversa, a submissão do imaginado às demandas (estritamente sociais) do mundo vivido. No âmbito desta discussão, interessa-nos, principalmente, nos aproximar das imagens dos filmes, para observar analiticamente a materialidade destas performances, identificando ali, quem sabe, uma dimensão política.
André Brasil é doutor pela UFRJ e professor do Departamento de Comunicação da UFMG. Pesquisador de Comunicação e Cinema, participou do júri de vários festivais e editais públicos, tendo realizado a curadoria da Mostravídeo Itaú Cultural em 2006. Ensaísta, publica em revistas de cinema e artes visuais.
// 16h às 17h – Cézar Migliorin (UFF)
Ficcionalização, biopolítica e a invenção da cidade no audiovisual contemporâneo brasileiro.
A cidade é um espaço primordial de disputa política e estética, nela se explicitam e se constroem as possibilidades sensíveis dos indivíduos, as operações do biopoder e as resistências com a própria vida. Na relação de filmes e sujeitos com a cidade, pretendo refletir sobre as escrituras que hoje constituem essa disputa política e estética. De maneira ampla: que cidade se forja e se representa nesse cinema? Entre a atenção às formas de circulação e ficcionalização de si e as práticas identitárias, o que está em jogo parece ser o próprio estatuto da imagem e sua possibilidade política em obras que buscam entender e operar na cidade.
Cézar Migliorin é pesquisador, professor e ensaísta. Membro do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFF e professor adjunto do Departamento de Cinema e Vídeo, é Doutor em Comunicação e Cinema (Eco-UFRJ/Sorbonne Nouvelle, Paris).
// 17h30 às 18h30 – Paula Sibilia (UFF)
O eu performático do audiovisual contemporâneo: Da crise da identidade e da interioridade à construção de si como personagem
Na era do espetáculo generalizado, o real ganha uma aura inusitada. Especialmente no que tange às personalidades, que procuram se estetizar recorrendo aos códigos e recursos midiáticos do universo audiovisual. Essa tendência não se verifica apenas nas quantidades imensas de fotografias e filmagens caseiras que milhões de pessoas realizam cotidianamente, e que logo se divulgam via internet, mas o movimento se expande na miríade de reality-shows da televisão e contagia também a produção cinematográfica. Propõe-se aqui uma reflexão acerca deste fenômeno como um sintoma de certas mudanças históricas nos regimes de produção de subjetividades. No momento atual, marcado por uma crise das identidades fixas e estáveis e da “interioridade psicológica” em torno da qual se edificava o sujeito moderno, persistem tanto a referência identitária como a valorização da autenticidade. Isso se constata nas inúmeras tentativas de criação de personagens audiovisuais verossímeis, não porque sejam fieis a alguma essência interiorizada (aquilo que são), mas porque conseguem aparentar e mostrar — e, nesse mesmo ato, inventar ou performar — aquilo que estão sendo. Quais são as implicações estéticas e políticas dessas novas estratégias de construção de si?
Paula Sibilia é professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e do Departamento de Estudos Culturais e Mídia da UFF, pesquisadora do CNPq e da FAPERJ, e autora dos livros O homem pós-orgânico (2002) e O show do eu (2008).
Dia 14 de abril – quinta-feira
Cinema e perspectiva
Mais do que indicativa de uma suposta diversidade no domínio do cinema, a produção de filmes por diretores e grupos indígenas aponta, mais profundamente, para uma outra concepção de imagem. Aqui, a imagem se apresenta como espaço relacional, que se constitui como perspectiva (Eduardo Viveiros de Castro). Produção do corpo (e não apenas do espírito), a imagem será, assim, o lugar de uma tomada de posição: por meio dela, criam–se mutuamente o sujeito e o mundo do qual será o sujeito.
// 9h30h – 10h30 – Rosângela Tugny (UFMG)
Entre povos-imagens
Refletir sobre as experiências em torno da escuta e do olhar, tal como as vivo quando estou junto aos povos indígenas Tikmũ’ũn, é me prestar a um constante confronto entre ontologias: as nossas e as deles. Nossas avaliações do sonoro e do visível, concentradas usualmente nas noções de “imagem”, “espírito” e “realidade”, se deslocam para aquelas de eventos, de corpos hiperbólicos e de uma severa vigília da intensidade. Ao contrário do que inspira um de nossos mitos fundadores, quando Orfeu canta para ultrapassar mundos excludentes – um mundo de trevas e um mundo visível – e projeta, culpado, seu olhar para o que está apartado, os Tikmũ’ũn me fazem pensar que a relação é a condição que precede e funda o visível e o sonoro.
Rosângela Pereira de Tugny é professora associada ao Departamento de Teoria Geral da Música da UFMG e pesquisadora do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq). É Doutora em Música pela Université de Tours (França), com Pós-Doutorado em Antropologia Social pelo Museu Nacional (UFRJ). Trabalha principalmente na tradução de cantos xamânicos junto aos povos Tikmũ’ũn.
// 11h00 – 12h00 – Ruben Caixeta de Queiroz (UFMG) [Alterado]
Filme-Ritual: objetos e sujeitos nos filmes indígenas
A partir de uma análise de trechos de filmes realizados por pessoas ou coletivos indígenas, pretende-se demonstrar como os processos constitutivos dos filmes são mais importantes do que o resultado final, como a mise-en-scène de quem filma se mistura com a mise-en-scène das pessoas filmadas, ou, ainda, como corpos filmados e corpos que filmam se duplicam e se embaralham, diluindo a fronteira entre sujeito e objeto, entre vida vivida e vida construída como narrativa cinematográfica. Por fim, queremos sugerir que os filmes indígenas são máquinas de produzir cultura com aspas e de inventar realidades, ou, dito de outra forma, são meios de produzir relação.
Ruben Caixeta de Queiroz Doutor em Letras e Ciências Humanas pela Universidade de Paris X (Nanterre). Professor de antropologia da Universidade Federal de Minas Gerais, onde coordena o Laboratório de Etnologia e do Filme Etnográfico (LEFE/FAFICH/UFMG). Co-editor da Revista Devires e co-fundador do forumdoc.bh. Trabalha (pesquisa e presta assessoria antropológica) junto aos povos Waiwai desde 1994.
O devir político da arte
Se a arte possui uma dimensão política, é porque pode produzir, por meio das obras, uma redistribuição de nosso espaço simbólico e material (Jacques Rancière). Este devir político faz encontrar o cinema com os outros modos de expressão artística (a fotografia, a performance, a instalação, as intervenções urbanas…). Sem desconsiderar as especificidades de cada um destes regimes expressivos, interessa-nos pensar os atravessamentos e tensionamentos entre uns e outros, nos atentando para o modo como ali se cria e se intervém em um comum.
//14h30 às 15h30 – Ivana Bentes (UFRJ)
Politícas do simbólico
O que é arte política? Hoje o “politico” na arte contemporânea acaba sendo associado de forma restritiva ao que seria o enfraquecimento do “estético” pensado na sua configuração moderna. Mas podemos falar de uma linha subterrânea que irrompe de forma extemporânea em operações singulares e figuras de linguagem. Política do simbólico em que operações de síntese, fusões, ³montagem², remix de ideias/conceitos atravessam diferentes suportes e se transmutam e derivam em cores, sensações, ritmos, e reconfiguram o sensível. A estética e as operações simbólicas como política, a invenção de processos formais-sensoriais e as figuras de linguagem que transitam entre artes plásticas, cinema, instalações e mídia de massa. As noções de “Tupinambá” em Lygia Pape e “Afeganistão” em Arthur Omar, duas experiências de reconfiguração do simbólico.
Ivana Bentes é professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFRJ, pesquisadora do CNPQ e coordenadora do projeto “Estéticas da Comunicação: novos modelos teóricos no capitalismo cognitivo”. Doutora em Comunicação pela UFRJ, é também ensaísta dos campos da comunicação, cultura, estética e cultura digital.
// 16h às 17h – Stella Senra
Cinema, fotografia e política na obra de Paula Gaitán: os exemplos de Uaká e Kogi
Abordarei a relação entre imagem cinematográfica e a imagem fotográfica, tendo em foco a obra de Paula Gaitán e seu uso original da fotografia. Esta está presente em Vida, Diário de Sintra e Agreste, todos filmes nos quais são levadas em conta as transformações do campo fotográfico no seu confronto com práticas inauguradas pela arte contemporânea e nos quais se lança, igualmente, um diálogo com novas modalidades artísticas como as instalações e os ambientes.
Tentarei fazer um contraponto entre o curta Kogi (2009) e o longa Uaká (1988) a partir da interlocução que se instaura nesses filmes com “outras” imagens: o primeiro se desenvolve a partir de uma fotografia de um grupo dos índios Kogi, da Colombia: o segundo – a filmagem da festa do Kuarup no Xingu – evoca, em meio às imagens documentais, trechos de um filme de Meliès. Levarei em conta as possibilidades analíticas abertas pelas novas leituras políticas da fotografia na sua relação como o cinema, o tempo e a memória – especialmente pelo trabalho de Damian Sutton, 2009 que, também numa operação de “passagem”, transpõe para a fotografia a noção deleuziana de imagem-tempo.
Stella Senra é Doutora em Ciências da Informação pela Universidade de Paris II. Pesquisadora em Cinema com incursões nos campos da Fotografia e do Vídeo, é autora de O último jornalista – Imagens de Cinema e de algumas dezenas de textos em livros, revistas especializadas e catálogos de arte.
Dia 15 de abril – sexta-feira
Documentário e ficção: a reproposição de um debate
Desde a origem do cinema, a fronteira que define os domínios da ficção e do documentário vem sendo objeto de desconstrução e de redefinição. De um lado, teorias estruturalistas e pós-estruturalistas procuram desfazer o limite entre um e outro domínios, tendo como argumento a constatação de que o real é sempre efeito de uma operação discursiva e de que tudo seria, portanto, ficção. Por outro lado, vemos, mais recentemente, a reafirmação das fronteiras, que passaria pelas formas de indexação, assim como pelo contrato estabelecido com o espectador. Sem desconsiderar os avanços e impasses destas teorias, gostaríamos de ensaiar novas possibilidades de definição, que, mesmo provisórias, estejam atentas à práxis dos filmes e à relação que, por meio deles, se estabelece com o real e o outro filmado.
// 9h30 às 10h30 – César Guimarães (UFMG)
O real e a cena: documentário e ficção no cinema contemporâneo Diante da dificuldade de distinguir documentário e ficção com base na identificação de traços formais (imanentes e intrínsecos), definidores de cada um desses domínios, estudos teóricos recentes tem buscado auxílio – com relativo sucesso – na Pragmática e na Filosofia Analítica. Alguns filmes contemporâneos, entretanto, ao abordarem sob novas maneiras o “primado do real” (segundo a expressão de Comolli) e ao colocarem em crise a posição do espectador, continuam a desafiar a pertinência e o alcance de uma distinção categorial entre ficção e não-ficção.
César Guimarães é Doutor em Literatura Comparada pela UFMG, com pós-doutorado pela Universidade Paris VIII. Professor do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da FAFICH-UFMG e pesquisador do CNPq, dedica-se ao estudo do cinema moderno e da experiência estética. É também editor da revista Devires – Cinema e Humanidades.
// 11h às 12h – Cláudia Mesquita (UFMG)
O mundo como olhar: Viajo porque preciso, volto porque te amo
Proponho ensaiar a fronteira ficção-documentário a partir da leitura de um filme. Em Viajo porque preciso, volto porque te amo (Marcelo Gomes e Karim Ainouz), à primeira vista, ficção e documentário se relacionam sem se misturar, quase como correndo em paralelo.Em termos de canais narrativos, a “ficção” se restringe à voz (do pesonagem-narrador), enquanto o “documentário” está presente sobretudo nas imagens. Em termos de processo de realização, o “documentário” vem primeiro, relacionado ao registro de imagens (sem uma intenção narrativa precisa), em uma viagem que fizeram os cineastas pelo sertão nordestino; a “ficção” vem depois, como um dispositivo de agenciamento das imagens na montagem, a partir da criação de um personagem imaginário, cuja perspectiva fornece ancoragem subjetiva e ordenação para os registros documentais. Pela relação travada entre imagens e voz na montagem, a ficção vem apagar a presença dos cineastas nas cenas, para lhes sobrepor o olhar e o comentário do personagem José Renato, geólogo em viagem. “O mundo como olhar”, propõe a ficção, ao que o documentário parece responder: “O olhar através do mundo”. Essas e outras relações (entre o documental e o ficcional) conduzirão nossa abordagem do filme.
Cláudia Mesquita é professora no Curso de Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). De 2007 a 2010, foi professora na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). É realizadora e pesquisadora de cinema, com mestrado e doutorado pela Escola de Comunicações e Artes da USP.
O trabalho dos arquivos
Em uma sociedade na qual os arquivos se proliferam (aqueles dos acervos, das bibliotecas e das instituições públicas; aqueles da vida doméstica, e ainda aqueles dos bancos de dados e dos sistemas informacionais), o cinema se torna um lugar privilegiado no qual eles são restituídos. Em chave benjaminiana, algumas experiências fílmicas recusam a dimensão puramente factual do arquivo (que garantiria algo como uma verdade acerca do passado) para investir em sua potência de redenção.
// 14h30 às 15h30 – Anita Leandro (UFRJ)
O arquivo aberto – Montagem e trabalho do tempo em 48, de Susana de Sousa Dias
A proliferação de arquivos entre nós nem sempre significa uma verdadeira abertura que daria acesso ao passado e dissiparia as nuvens do presente. Predomina, ao contrário, uma visibilidade de superfície, calculada, censurada. Mas abrir os arquivos constitui, talvez, o gesto político mais radical que a escrita com imagens e sons ainda é capaz de assumir. 48, documentário construído a partir de fotografias de identificação policial de presos políticos durante o governo Salazar, mostra os rostos das vítimas da longa ditadura portuguesa como feridas abertas no tecido da história. Do fundo dos arquivos da repressão ecoa a voz inaudível dos mortos de que falava Aby Warburg. Atravessa essas fotos o grito de uma dor infinita, que só pode ser aplacada por meio da difícil elaboração da palavra dos sobreviventes ali retratados. Na montagem, os testemunhos trazem à tona o trabalho do tempo e cavam, nos arquivos, um túmulo para os olhos, como diria Daney.
Anita Leandro é professora de cinema da Escola de Comunicação da UFRJ, e desenvolve pesquisa sobre o documentário de arquivo, com apoio do CNPq. Possui mestrado e doutorado em Estudos Cinematográficos e Audiovisuais pela Université Paris III (Sorbonne-Nouvelle).
// 16h às 17h – Maurício Lissovsky (UFRJ)
O despertar dos arquivos
A história dos arquivos modernos reflete as tensões entre campos institucionais (do estado, da academia, das corporações e do mercado), as sucessivas reconfigurações dos limites entre público e privado, e os diversos regimes de produção do verdadeiro. Todo arquivo guarda os sedimentos destas lógicas em sua estratificação; e cada documento de arquivo, cada resto, cada traço que ele abriga, é um amalgama complicado das redes que buscaram apreender seu sentido e prescrever seu destino. Ao longo sua existência, no entanto, uma dimensão oculta permaneceu ativa, trabalhando. O trabalho dos arquivos é o trabalho dos sonhos adormecidos em seu ventre. E se hoje eles retornam em proporções exponenciais, como multidões despertas de um sono milenar, redivivos pelo toque mágico da fada digital, uma pergunta ganha força de urgência: somos nós que os estamos libertando ou são eles que descobriram um modo de nos assombrar?
Mauricio Lissovsky é historiador, roteirista, professor de roteiro e teoria visual na Escola de Comunicação da UFRJ. Doutor em Comunicação pela mesma universidade, onde coordena o Programa de Pós-graduação em Comunicação e Cultura. Autor de A máquina de esperar: origem e estética da fotografia moderna (2008).
Narayana,
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