18/02/2022 – 14h30
Performance, Dança e Imagem
Com Ana Pi

Primeira Parte
Segunda Parte

Com filmes e coreografias, bem como na passagem entre domínios e suportes, Ana Pi elabora um instigante repertório de questões contemporâneas em torno da identidade, da negritude, dos deslocamentos e formas de reconexão com a ancestralidade e com o futuro. Em suas aproximações com as imagens em movimento, coloca o corpo e a dança em contato direto com as formas da linguagem audiovisual criando, de maneira singular e inventiva, imagens de complexa temporalidade.

Para encerrar o IX Colóquio Cinema, Estética e Política Ana estará conosco para uma conversa em torno de suas obras e de sua trajetória entre a dança e as imagens em movimento.

Ana Pi (Belo Horizonte, 1986) é artista da coreografia e da imagem, pesquisadora das danças urbanas, dançarina extemporânea e pedagoga. Sua prática está situada entre noções de trânsito, deslocamento, pertencimento, sobreposição, memória, cores e gestos ordinários.

Que numa tal época de perturbação sangrenta
De desordem instituída, de arbitrário planejado
De humanidade desumanizada,
Nada seja dito natural, a fim de que nada
Passe por imutável.
Bertolt Brecht

A mão lavora a antiforma
Atrás da pátina, a fábrica
de esqueletos.
A mão que desmonta enfrenta
o cálculo.
Afronta a lição colonial.
Edimilson de Almeida Pereira


uma mesa que é como uma cama diurna
com seu coração de árvore, de floresta
é importante em matéria de amor não meter os pés pelas mãos
mas mais importante é ter uma mesa
porque uma mesa é uma espécie de chão que apoia
os que ainda não caíram de vez.
Ana Martins Marques

Estritamente, colóquios acadêmicos costumam se constituir por mesas, que abrigam conferencistas e mediadores e que os separam do público, ao qual cabe assistir e eventualmente debater. Esse modo do parlamento, sabemos bem, não é único (sendo, afinal, recente e restrito): é variável a cena do comum, a começar pela palavra miúda à sombra da árvore ou na soleira da porta, pela roda de conversa, pelos mais variados modos da assembleia, pelas provocações disruptivas do happening e da performance, ou mesmo pelo compartilhamento do silêncio de uma pausa.

Com a proliferação dos encontros remotos e das lives durante a pandemia, vivemos um duplo e paradoxal movimento: nunca se expôs e se falou tanto, mas, como nunca, as formas da conversa e da escuta se estreitam e se exaurem, confinadas em um espaço esquadrinhado, no interior do qual os corpos se debatem na tentativa de criar algo para além do isolamento. Ao mesmo tempo, na esteira de movimentos históricos anteriores, as lives vêm sendo, de algum modo, ocupadas, “indigenizadas”, “aquilombadas”. Lideranças, artistas e pensadores indígenas, quilombolas, negros e negras ocupam as redes digitais com seus saberes e suas ciências e, mesmo sendo os mais afetados pela necropolítica em curso, são os que mais têm oferecido alternativas de reinvenção e reencantamento do comum.


Em sua nona edição, o IX Colóquio Cinema, Estética e Política se realiza inquietando-se com sua própria forma, debatendo-se com a exaustão produzida pelos eventos online, imaginando ainda maneiras de estarmos juntos, que recusem o “novo normal”, para acusar que a normalidade não é nada mais do que a naturalização das opressões e das injustiças.


Movido por essa inquietação coletiva, o Colóquio não estará concentrado em um evento circunscrito, mas atravessará o ano, com encontros mensais, cada qual buscando encontrar um modo, uma modulação (uma antiforma?) para o espaço comum, que possa ser atravessado pelos modos que vinham já historicamente tensionando os formatos acadêmicos – a roda, a performance, o ensaio.


Com isso, continuamos a investigar o que tem nos interessado desde as primeiras edições do Colóquio, ou seja, o que pode politicamente uma imagem: intervir no sensível para participar da composição de maneiras de estar juntos; instaurar alianças que não elidam as diferenças, as separações e as opacidades, mas que se constituam por elas; retomar a história, para mostrar a contingência das formas, a possibilidade, portanto, de seu estranhamento e reinvenção; abrir-se como intervalo, como interrupção, no interior dos quais habitamos, cuidando desse lugar entre – de troca e partilha – que vem sendo objeto de insistentes ataques por parte do projeto de extrema-direita no país: a linguagem, as relações, a imagem como diferença, a possibilidade mesma da política.


O IX Colóquio prioriza conversas e partilhas em torno de propostas e processos de criação, elegendo como norte não o debate de obras acabadas, mas a elaboração e troca sobre o que está em curso e por vir. Quem sabe as conversas venham a adensar e amparar historicamente as ideias e as imagens, em sua emergência. É o nosso desejo, nossa aposta.